De mãe e louco todas temos um pouco

Sejam bem vindos ao cantinho aconchegante que reservei para essa conversa. Espero que esses relatos possam de alguma forma ajudar aqueles que tem duvidas, receios, e as vezes até mesmo culpa por não serem perfeitos como gostariamos de ser para nossos filhos, que ja estão aqui, ou estão por vir.
Essa é minha forma de compartilhar essa experiencia fantastica que tem sido me tornar mãe, inclusive pelas dificuldades que passei, passo e com certeza irei continuar passando por ser Bipolar. E o quanto nos tornamos mais fortes a cada dia, a cada queda, como essa pessoinha que chegou me mostra a cada dia que passa.
A todos uma boa sorte, uma boa leitura, e uma vida fantastica como tem sido a minha, desde o começo e cada vez mais agora!

sexta-feira, 27 de setembro de 2019

Sobre me deixar sentir...


Eu tenho tido fins de semana muito bacanas nas últimas semanas. Tenho jogado RPG com amigos que tem se aproximado mais e tem sido muito bom, divertido e libertador.

Esse fato, os jogos de RPG nos fins de semana, tem sido uma consequência da reaproximação de alguns amigos nos últimos meses. Além dos jogos de RPG, temos recebido amigos em casa, dado suporte a amigos com dificuldades e feito da nossa casa o que sempre desejamos: um local seguro, um refúgio, um local que você se sinta bem recebido e tenha vontade de voltar.
Esse movimento de receber, de acolher, é algo que faz parte de mim, é uma das minhas principais características. Taz chegou na minha vida e se sentiu a vontade exatamente por causa disso e ao iniciarmos nosso relacionamento ele tomou para si parte dessa característica, se identificou, e hoje é corresponsável pela manutenção dessa rede.
Agora, apesar disso, tem uma coisa que eu sinto e da qual nunca falo que as vezes me parece ir contra todo esse sentimento de mamãe coruja.

Eu não me sinto confortável com toque.

Isso não é algo que eu senti sempre. Sempre fui tímida, sim, e não demonstrava ou recebia bem demonstrações de afeto de desconhecidos, mas depois que me sentia mais a vontade conseguia relaxar e aceitava bem a aproximação das pessoas.

Isso mudou muito depois do nascimento da Rebeca.

Sinto que fui me fechando cada vez mais para o mundo, criando uma proteção, uma barreira para me proteger e manter o controle. Eu sinto, o tempo todo, que posso perder o controle a qualquer momento. E eu não posso perder o controle.
Inicialmente uma barreira mental, sem que eu percebesse isso foi crescendo, ao ponto que eu não me sentia bem recebendo elogios, abraços, beijos no rosto, apertos de mão, ou qualquer coisa que pudesse me expor de alguma forma.
Duas ou três vezes no ano eu tento abrir mão desse controle tendo uma noite onde vou beber, ficar levemente bêbada, dar risada e não me preocupar com mais ninguém a não ser minha própria diversão. Sempre acompanhada de alguém para dividir esse momento, nunca sozinha. O que faz com que muitas vezes o plano de errado e eu me veja tendo que cuidar desse outro alguém, mas são experiências mais positivas que negativas então mantenho o plano.
Pode parecer besteira mas é muito difícil se permitir esses dias e mesmo nesses situações eu estou sempre a apenas um “clique” de voltar a me fechar, me concentrar, ser responsável.

O que eu quero focar um pouco aqui é na questão do ser tocada. Com todas as dificuldades e as crises depressivas, de leves e contínuas as mais graves, eu fui desenvolvendo uma certa aversão ao toque de outras pessoas. Ao ponto de que em alguns momentos o único toque que eu me sentia realmente confortável era o da Rebeca. Com ela era o único momento que eu me sentia totalmente a vontade.

Com o Taz esse sentimento ia e vinha dependendo do meu humor, do tom das conversas, mas mesmo assim isso afetou profundamente nossa relação. Mesmo me sentindo segura com a presença dele a maior parte do tempo eu simplesmente não consigo baixar totalmente a guarda.

E dai que isso começou, lentamente a mudar no último ano. Com tudo que passei com minha mãe adoecendo, a mudança, a perda do meu sogro… Eu não tinha como não estar vulnerável. E durante esse período algumas pessoas voltaram ou passaram a estar bem mais presentes na minha vida. Amigos que me ofereceram não apenas ajuda em coisas práticas, mas atenção e carinho. E carinho na forma, também, de abraços.

Eu não me senti confortável com o toque, com ser tocada, num primeiro momento. Mas eu senti, sinto, a necessidade dessa proximidade. Eu quero muito ter essas pessoas na minha vida e quero que elas se sintam sim na liberdade de serem afetuosas comigo. Porque elas são assim. E porque eu percebi, enfim, o quanto eu preciso disso.

Os abraços inicialmente mal retribuídos, pois eu não sabia mais como me portar, aos poucos tem sido cada vez mais bem vindos.
E o que começou como uma reciprocidade tímida e muito inconsciente, de repente com todas essas peças se juntando me fizeram querer tomar a ação.

Eu ainda sinto, a cada abraço, que se eu ficar ali aninhada por tempo demais eu vou simplesmente perder o controle. Vou cair num choro sentido de quem não sabe o quanto sente falta de se permitir sentir qualquer coisa.

E o que eu percebi é que: eu ainda não consigo e não sei como fazer isso, mas eu quero voltar a sentir de novo.

Não sei como descrever isso melhor. Eu quero voltar a me deixar sentir.

E apesar disso me causar um medo absurdo, a vida é muito curta e muito imprevisível pra ter medo o tempo todo.

E eu quero, em algum momento, não sentir mais medo. Pelo menos não de mim mesma.

sábado, 21 de setembro de 2019

Sobre o dia da árvore, ou sobre a minha amoreira...

Eu nasci no começo dos anos 80. Estou no começo da geração Milenial e no final da geração X.
O Brasil lutava por sua democracia, sobrevivia entre a hiperinflação e as novidades apresentadas na TV. O mundo mudava e tentávamos alcançá-lo. Perdoamos o passado para tentar ter chance de fazer um futuro melhor.

Nesse contexto meus pais se casaram no fim dos anos 70 e tiveram a minha irmã e eu no começo dos anos 80.

Quando nasci morávamos em uma casa na zona Oeste de SP, numa rua calma, residencial, em uma parte do bairro que entre suas grandes casas, nos abrigava no início de nossa jornada.

Meu pai sonhava alto e iniciava seu próprio negócio ao comprar uma escola em uma cidade vizinha com o ideal de unir o seu desejo de educar e mudar o mundo e crescer profissionalmente num momento instável da economia do país.

Minha mãe se estabelecia como uma das principais responsáveis no laboratório de uma grande multinacional do setor de combustíveis.

E eu e minha irmã chegamos para completar o quadro.

Na casa grande da rua tranquila, pensada e escolhida, um enorme quintal gramado nos fundos da casa. Nele, 3 árvores frutíferas. No centro do jardim um pequeno limoeiro, meio pelado, minguado, fazia lugar de pouso para os passarinhos. No canto inferior direito, uma árvore alta de frutinhas vermelhas semelhantes a morangos sem sementes que nunca mais vi e até hoje não sei o nome. Minha vó era a única que quando essa árvore ficava carregada de frutos, andava embaixo da copa catando e comendo essas misteriosas doçuras que ela levou o nome consigo na minha memória...

E do lado esquerdo, no centro esquerdo, não exatamente num canto, uma enorme amoreira de tronco forte e galhos grossos o suficiente para nos sustentar a subida.

Não lembro quantos anos tinha quando aprendi a segurar no galho mais baixo, e dando um impulso jogar as pernas por cima do tronco que, a uma pequena distância do chão, se repartia em um V e continuava a subir e abrir seus galhos para o sol. Espalhando sua sombra, e tendo no V do tronco um local perfeito para iniciar a subida, quase uma cela na madeira, era para lá que jogávamos as pernas no impulso. Dependuradas no galho, pernas no tronco, abraçávamos a árvore e nos ajeitávamos para continuar a subida.

A amoreira ficava bem perto do muro da casa e ao subir podíamos ver a casa do vizinho. Nossos gatos fizeram esse caminho muito mais do que nós, usando essa proximidade entre planta e pedra para escapar e explorar outras residencias e voltar com segurança.

Uma vez por ano a amoreira ficava carregada de amoras, primeiro verdes e instigando nossa ansiedade, depois vermelhas com seu azedinho e por fim pretas e maduras, doces, ideais para serem colhidas. Tingiam o chão de terra embaixo da árvore de roxo da mesma forma que tingiam nossos dedos e bochechas lambuzadas.

Dessas amoras fizemos sucos, sorvetes, geleias e bolos. Dividimos nosso tesouro com periquitos, bem-te-vi, e todo tipo de pássaros.

Dividimos nosso quintal e nossas árvores com amigos e familiares por cerca de uma década, quando no começo dos anos 90 meus pais decidiram se mudar. Vendemos a casa para poder seguir adiante e continuar construindo nossa história.

Mas deixamos para trás nossa amoreira. Deixei com ela a primeira parte da minha vida. Trouxe comigo o gosto doce das boas lembranças.

Trouxe comigo um amor a uma amoreira...


domingo, 15 de setembro de 2019

Sobre o que me faz feliz...

É noite e estamos os 3 em casa, sentados no sofá e assistindo um vídeo divertido do YouTube na TV. Rebeca escolheu o vídeo e tentamos acompanhar o que ela assiste junto com ela. O O vídeo é engraçado e despretensioso e damos risada.

Eu  tenho meu celular na mão mas não estou prestando atenção nele. Assisto o vídeo que aprendi a apreciar. Taz tem o celular na mão também e divide a atenção do vídeo na TV com jogadas em algum jogo de tantos que joga pelo aparelho em sua mão.

Estamos os três sentados, meio esparramados, no sofá com Rebeca entre nós dois. Nosso cachorrinho, Chewbacca, sobe no meu colo e dali para o sofá buscando seu lugar nesse momento em família.

A cena é quase perfeita. Falta uma pessoa pra completar esse quadro: minha menina mais velha. Com mais de 20 e terminando a faculdade e eu ainda insisto em vê-la como uma menina... Mas ela está em casa, com sua mãe. Mando uma mensagem para saber se está bem e quando vem nos visitar.

Por hoje somos nós 3, e o Chewie, e por hoje basta.


A cada noite essa cena se repete e me preenche. Como peças que finalmente se encaixam eu sinto que estamos finalmente nos sentindo em casa. Por cada minuto que nós mantemos assim, cada noite que essa cena se repete, sinto algo que procurei por muitos anos e as dores da vida não me permitiam encontrar: sinto ter ali, nesse lugar, nessa cena, o meu lar.

Respiro um suspiro, um quê de apaixonado outro de alívio. A qualquer momento alguém vai levantar e fazer outra coisa. Tem o jantar, o banheiro, a roupa, a lição, ou qualquer outra coisa assim. A qualquer momento o mundo vai chamar atenção para si e nos fazer nos mexer, nos buscar, desenroscar.

Eu respiro, suspiro e admiro aquele momento de lar que construí. Demorei meses para conseguir chegar aqui. O corpo estava desde a mudança, mas o coração ainda em pedaços não me permitia estar inteira. Ah nenhum de nós.

Conforme vamos colando os pedaços quebrados, chegamos ao ponto de com parte desse mosaico tomando forma, juntar nossos cacos no mesmo lugar na mesma hora e com, eu acho, a mesma emoção. Por esses minutos que as vezes viram até mais que uma hora, todos os dias, nos encontramos.

Esparramados no sofá, esparramamos em nós o calor e o amor do outro, pro outro, pelo outro, e por nós. Com os pés enroscados, enroscamos as conversas e rimos.

A felicidade mora ali, nos detalhes, na rotina. A felicidade, mora aqui, no sofá da minha casa.